Sexta-feira, 12 de Julho de 2013

Somos Todos Aprendizes

 

 

 É interessante o Saber. Mais do que sermos aprendizes, estamos diuturnamente (e para sempre) aprendizes. Se vivêssemos mil anos, lêssemos milhares de livros, fizéssemos dezenas de faculdades, o que saberíamos? Um por cento de tudo, se tanto. Há tanto para se aprender, um infinito de coisas.

A vida é um eterno aprendizado. Um amigo meu diz que, da vida só levamos, o Amor e o Conhecimento. Podemos (podemos?) nos especializar sobre física quântica, fauna marinha, pintura abstrata, rock moderno, pós-modernismo, mas, e os outros zilhões de temas que nunca saberemos? Para conhecermos a técnica de solar violino, pintar paredes, assar pato selvagem, geologia lunar, astronomia, e milhões de outros assuntos, uma vida só é muito pouco. Há outros novos céus e outras novas terras? Na casa do pai há muitas moradas, diz os Evangelhos...

Outros teorizam que, vivemos mesmo 9 meses.

Depois vamos morrendo um pouco. Vivendo e aprendendo.

Cada dia, um dia a menos. Instantes, segundos, minutos. Conquistas íntimas, evoluções.

Morre-se a cada dia? Ou é morrendo que se nasce (e se ascende) e brilha para a vida eterna? Perdemos a beleza, os cabelos, os dentes, a saúde, os amigos, as pessoas que amamos. O aprendizado da perda. Da ausência. Por isso existem os poetas, as baladas de amor, os pintores, os romancistas. Tudo é Soma.

O primeiro amor, o primeiro adeus, o primeiro trauma, tudo uma maneira de rirmos desse mundo, e também de evoluirmos, no amor e na dor. Temos que tirar lições de tudo na vida. Dias são aulas. Nossos problemas são nossos professores também? E os nossos melhores amigos são os nossos Mestres. Quem não se dá bem com um Professor, vai se dar bem com quem?

A pedra bruta, para se tornar diamante, tem que sofrer o sacrifício do fogo, da perda de um tanto de si. Nascemos para o aprendizado. Sempre. Andamos para frente. Criamos para cima. Produzimos conhecimentos, a vida toda. Descobertas. Canteiros. E vamos semeando os nossos passos, dias, abraços, emoções. Um Poeta cantou: - Há pessoas que passaram pela vida e perderam a viagem!

Acho que assim é a vida. Ainda velhos, na sabedoria dos tempos, quantas vezes aprendemos um sorriso novo, uma nova forma de ver a vida, uma balada de incêndio, uma técnica de nos reconhecermos em nós? A criança é um poço de pureza. Jovem é energia, busca, sonho, procura. No final da vida, um lastro.

Como Educador, aprendo com alunos. Troco com eles. Eles dão-me luz, e eu ofereço técnicas, noções, bases, aprendizados, traquejos. Facilito. Há os que oferecem a vida por uma causa e, ao fim dela, notam, num dia qualquer, que viveram em vão. Uma rua, um mar, um segredo, uma paixão. Tudo um grande livro aberto: o aprendizado da vida.

Lemos e nos encontramos. Choramos e crescemos. Sorrimos e criamos elos de luz. Há um Deus. Cada um já deu de per-si, a sua cota de soma para uma vida ética, humanitária, plural?

Minha mãe, à beira do rio Itararé, usando-se de termos antigos como guaiú, forfé, cainho, maleixo, deusolivre, crendêospadre e tantos outros, deu-me um repertório, para a minha lavra de Sentidor. Poeta aprendiz. Encantários. Meus sobrinhos-filhos e alunos-filhos dão-me palavras novas. É preciso mesmo amar as pessoas como se não houvesse amanhã.

Um filme, uma tempestade, um livro, um site, uma aula, uma vida inteira, são sempre Lições da Viagem de Existir.

Sim, somos todos eternos aprendizes.

A vida é uma grande lousa. O calendário de nossos dias, são páginas abertas. Vamos dando testemunhos de nós. Aprendizados. Técnicas e lastros. Bagagens e somas. Elos e sabedorias. Como dizia a canção de Caetano Veloso que a Gal Costa cantava: É preciso estar atento e forte!

Claro. Para não perder o filé da essência do verbo EXISTIR.

Quando soubermos todas as lições, VOAREMOS?

 

-0-

 

 

Texto da Série INVENTÁRIOS E PARTILHAS (Livro inédito do autor)

Poeta Prof. Silas Corrêa Leite – Itararé-SP, Cidade Poema

Docente de Escola Pública – Pós-graduado em Educação (Mackenzie) e Literatura (USP), Jornalista Comunitário, Conselheiro em Direitos Humanos – Prêmio Lygia Fagundes Telles Para Professor Escritor

Autor do Romance ELE ESTÁ NO MEIO DE NÓS, no site

www.itarare.com.br Blogue pessoal:

www.itarare.com.br/silas.htm

E-mail: poesilas@terra.com.br




publicado por Do-verbo às 16:47
Segunda-feira, 04 de Março de 2013

...Para o Poeta

Para Décio Pignatari

“Estão todas as verdades/À espera de todas as coisas(...)

Eu acredito que torrões de barro/Podem vir a ser lâmpadas/

E amantes” – Walth Whitman (Leaves of Grass)

...................................................................................

 

Para o Poeta...

O sol se põe numa caixa de fósforos antiga

O arroz-doce feito com losangos de chocolate com menta é manjar dos deuses

Cerveja é rica em amizades boêmicas com muita fibra de suporte existencial

Os horizontes estão cheios de historias em quadrinhos em preto e branco

E as auroras são barbantes cor de rosa-pitanga dos deuses amando rebentos crepusculares...


Para o Poeta...

Amar é céu e inferno; viver é livro como um uivo e morrer é orgânico

Crianças mesmo são envelopes de luz à espera de serem preenchidas por nódoas e tintas, vagidos e frutas

Velhos são sábios como tamarindeiros carregados de rubis fantasmas

Poemas são esparadrapos colados em cicatrizes íntimas de percursos inexatos pelas sofrências

Músicas são solos de silêncio para quem precisa de regra e lição, não de desenhos abstratos em humanismo de resultados...


Para o Poeta...

A terra é um marmitex de Deus para o projeto trágico da vida, evitando ser rotina a viagem de existir na incompletude da pobre alma avelã

Para o Poeta...

Escrever é livre como um rio. As margens, correntezas e atoleiros, dependem das interpretações de quem se lê por suas próprias pegadas, promessas, luzes ou cavernas íntimas...


Para o Poeta...

Nem tudo que reluz é fêmea, nem tudo que reluz é luz

E se a vida não lhe der limões, faz limonada de lágrimas de crocodilo...


Para o Poeta...

O céu é o silencial, muito além daquele turvo infinital de garrafa pet

Quando um anjo maldito grita “Quem enlouquece sempre alcança”

E um eco sinistro retruca: “Deus ajuda quem cedo se insurge...”

Todos os nossos endereços podem ser passageiros

Porque nada é para sempre – nada existe para ser para sempre aqui e agora – nem uma vida só é pouco

Pois na casa do pai noiteadeiro há muitas geladas...


Para o Poeta...

A alma dos lazarentos é feita de lápis de cor

A solidão é a melhor amiga do carrasco notívago

Como o travesseiro de nódulos de isopor é o único refugio para o remorso de um guerreiro noia inseguro

Com sua colcha de retalhos cheinha de estrelas de sangue


Para o Poeta...

O impossível é escada para o porão, ou para o sótão. O difícil é aprendizado de renuncias com rivotril e comital, pois o fígado faz mal pro álcool

E o trabalho é uma pobre terapia que depois vira neura contemporânea de grosso calibre, feito um revolver quente


Para o Poeta...

Ser louco é uma forma de não se esconder na mesmice de tantas errações desvairadas

Mas fazer da inércia um belo sagu de groselha preta artificial made in china

E acreditar que a fé remove religiões...


Por fim, para o Poeta

A vida telúrica é apenas um gomo da cruz adâmica, da maçã podre da espécie, do papiros secretos feito de casca de laranja, e do espírito atribulado que ferra o ente sensível...

E o inferno e o céu em nós, pobres mortais na manada

Somos nós que fazemos – na vida o final feliz é que todos morrem –vivendo e sofrendo, morrendo e aprendendo

E escrevendo bulbos de desespelhos, como se voando com remos

Assim na terra como no céu...

 

-0-

 

Cyber Poeta Silas Correa Leite

Santa Itararé das Artes-SP/Brasil

E-mail: poesilas@terra.com.br

WWW.portas-lapsos.zip.net

 



publicado por Do-verbo às 21:08
Sexta-feira, 10 de Junho de 2011

Árvores de Vidas



Eu aprontava muito quando guri, e o pai
Vendo que só vara de marmelo não resolvia
Dava-me pitos cascudos e punha-me a plantar em casa
No quintal frondoso a lavoura de alfaces e milharais
Entre o castigo de ler dicionários, jornais e a Bíblia

Como eu gostava muito de macarrão, um dia
Plantei vários talos de macarrão espaguete
Que ficou verde; fui que fui contar pimposo pra mãe
Que o macarrão tinha pegado; tava brotando
Feito legume em terra chã - com estrume e regador

Todo mundo cerriu muito lá em casa esse dia
-Tá encardido, disse a minha irmã Sueli de tromba
Erzita outra irmã explicou que estava era apodrecendo
Porque macarrão não cresce em árvores como pitanga
Ou como gabirova, jabuticaba branca ou ariticum

E eu que já tinha sondado outros plantios e regas
Numa lavoura até de macarrão-gravatinha, ou, ainda
Pés de salsichas em lata, pés de Crush, tudo para mim
Que pensava dar em árvores – até arvore de passarinhos
Como galho de pencas de pardais no meu encantário...

Pelo jeito eu ainda criança já era poeta – e não sabia
A árvore da vida dá sofrências e alegranças também
Contei pro filho Thiago o pé de macarrão que um dia plantei
E ele todo ridente soube que seu pai um dia também foi criança
E errou, pintou e bordou. Mas também sonhou e venceu

Hoje meu filho Thiago Frederico é a minha árvore
Que já teve lágrimas mas florirá muitas esperanças na vida
E nos canteiros da terra semearemos além do nosso reencontro
Árvores de abraços, afetos, conquistas, pertencimentos
Porque, afinal, todos somos flores e frutos dessa vida


Silas Correa Leite



publicado por Do-verbo às 14:56
Sexta-feira, 18 de Junho de 2010

 

S A R A MA G O
(18.06.10)

 


 

 

“O mundo existe para terminar num livro” 
Mallarmé 
Morreu Saramago 
Em seu mundo nunca dantes navegado 
No entorno de lágrimas de Portugal 
E muito além do chão letral dos lusonautas 
Numa intermitência telúrica 
Morreu Saramago 
O criador de um verbo alumbrado 
Sua literatura esplende, arrebata 
Num mundo globalizado – e insano 
Muito além de seu tempo 
Morreu Saramago 
Entre seu palavrear de luz e sangue 
Densos Tejos que ainda rebrilham 
Em lágrimas que verteram seu espírito 
Procissão de excluídos 
Morreu Saramago 
Que nos viçou em língua mátria 
A sociedade sórdida: e o que somos 
Ovelhas perdidas de uma manada 
Contra a qual lutava... 
Morreu Saramago 
O ser humano historial, o homem bandeira 
Que na mão esquerda ainda tem uma roseira 
Que dá flores rubras a vida inteira 
Levantado do chão, nos ares 
AINDA VIVE SARAMAGO!
Silas Correa Leite, 
Santa Itararé das Letras, 
São Paulo, Brasil 
E-mail:


publicado por Do-verbo às 15:43
Sexta-feira, 19 de Março de 2010


Casa da Mãe
Para Eugênia de Oliveira Correa Leite, In Memoriam

Ir para casa e não ver a Mãe
É não estar em casa.
Ir para Itararé e não estar com a Mãe
É não estar em mim.
Ir para a Mãe e a Mãe não estar lá
Já é quase morrer.

Porque a casa e a Mãe se completam
Uma está em outra para assim muito bem estarmos em nós
E não encontrando a Mãe em casa
Podemos também não nos encontrarmos nunca mais.

Porque a casa-mãe-Itararé
É tudo uma soma de estarmos em nós mesmos
E da Mãe estar na casa e a casa ser a Mãe
Onde quer que a Mãe esteja.

Talvez, também, por isso é
A Casa, a Mãe, tudo - Itararé
Parte de nós. Como lágrimas no céu; como uma Igreja.

-0-

Silas Correa Leite,

Poetinha da Estância Boêmia de Itararé-SP

 



publicado por Do-verbo às 14:31
Sábado, 13 de Março de 2010

Pequena Resenha Crítica:“Da Humana Condição”Novo Livro de Poemas de José-Augusto de Carvalho, de Portugal
“É na regularidade da paisagem, e, por extensão, da descrição poética dela, que nos deparamos com o inusitado que quebra a expectativa e faz peculiar a poética (...) –

Ademir Demarchi – Escritor e Editor da Revista Babel

Além da belíssima apresentação gráfico-estética da edição (Edium Editores, Portugal, Estúdios da Edium Editores, Março 2008), o livro de poesia “Da Humana Condição” de José-Augusto de Carvalho, de Portugal, é uma nova excelente coletânea de poemas novos, de sua mais recente safra como sempre fora de série. Janelas – tábuas de esmeraldas? – de águas e lodos, de apontamentos e desapontamentos, da própria humana condição revisitada com olhares poéticos lustrosos (para o bem e para o mal), registrando verbos, lavas, larvas, perdições, análises em rotas letrais próprias, sensíveis. Tristemente sensíveis. A esperança já não se renova a cada dia, ou a esperança é a inteligência da vida?. Ou um experiente olhar afinado, como o do autor poeta, depurando a realidade, é também olhador de tudo de ruim e pressente para onde caminha a humanidade, em sua condição de caos anunciado, caos urbano, arrebentações de toda ordem? Ler e refletir sobre.
Pinturas literais de seu tempo se afinando, na medida do possível com os olhares severos fazendo releituras, tocando destemperos, fermentações, tristezas, utopias. Xavier Zarco (Coimbra), muito bem o define: “Poemas no seu esplendor (...) Não podemos manter o olhar cerrado (...) A condição humana se desnuda perante o nosso olhar (...)” Panoramas, nostalgias, banzos literários dentro de óticas humanistas: “...O verbo unindo horizontes/Com as cinzas ergueu pontes/De constante renascença” (pg. 57). Soberano no estúdio de sua alma, amargo ou crítico, ou na inevitável sofrência própria dos seres extremamente lúcidos para esses tempos tenebrosos (a pós-globalizaçao do crime organizado do neoliberalismo como um câncer social em detrimento do chamado humanismo de resultados), segue José-Augusto determinado, consciente e sábio o amigo virtual (lincado nesse mundo pelas infovias da net/web); mas também raro e rico amigo livral (presencial pelas obras portentosas que generosamente nos envia), José-Augusto de Carvalho está cada dia mais profícuo; cada dia melhor nos acabamentos, no auge criacional de sua vida-livro, inclusive com os seus novíssmos e importantes poemas que o retratam altamente produtivo, já que regulamente nos envia por e-mail suas produções e derramas, como um achador residual de se colocar na vida como parte alegre-triste dela, lendo a vida contemporânea, a dolorosa tábua da vida, como um testemunho de sua própria afirmação como ser entre os que se parecem com alguma coisa próxima do Ser (inclusive e principalmente socialmente falando), dando registro sério de sua época, de sua existência como ser humano e como humanista, ainda delatando os contrastes de seu tempo com olhares que estão acima dos campos de lavanda dos sonhos. José-Augusto de Carvalho nasceu em 20/07/37, em Viana do Alentejo, Portugal, tem já outros importantes livros como: Arestas Vivas (1980), Sortilégio (1986), Tempos do Verbo (1990), Vivo e Desnudo (1996), Nós Poesia (2002, como Lizete Abrahão), A Instante Nudez (2005) que tive o prazer de resenhar (um dos melhores livros de poemas que li em minha vida), e agora este seu da “Humana Condição”. Espero (esperamos) que José-Augusto de Carvalho continue com seu tear, na lida, pois o enorme prazer da leitura que nos encanta com trabalhados versos de qualidade, além do acabamento gráfico-editorial o que nos apresenta o trabalho literário de cara e capa, na beleza da obra que se reafirma pelo conteúdo enquanto riqueza lítero-cultural de um poeta na mais bela condição humana de poetar com gabarito e quilate: “As vezes o silêncio esmaga/O tumulto das palavras (Verbo de Pedra, pg 51). O livro é um atual depoimento poético “de homens em tempos sombrios”, para lembrar Hannah Arendt, em Entre o Passado e o Futuro/A Condição Humana.
*
Silas Correa Leite,
Itararé, São Paulo, Brasil
22/5/2008


publicado por Do-verbo às 03:40
Sexta-feira, 12 de Março de 2010

 

Itararé Que Eu Adoro Tanto - Uma História de Vida

  -Só Deus sabe o que um filho ausente de Itararé sofre – longe de casa, da rua e quintal de infância, dos pais, dos amigos, do toldo estrelado de Santa Itararé das Artes, Cidade-Poema, terra de ancestrais, berço esplêndido, aldeia-mãe... Só mesmo Deus sabe... Saí muito cedo de casa. Comecei a trabalhar muito cedo – engraxate, vendedor de dolé de groselha preta, bóia-fria – e com 14 se tanto fui trabalhar na Marcenaria Estrela do Jora Moveis que se mudaria par Ribeirão Vermelho do Sul, aquele tempo ainda não com o nome feio de Riversul... que depois da mudança do nome se tornou... Depois, voltando para Itararé, fui trabalhar no Bar do Calixtrato, de onde migrei para Sampa, 18 anos, 1970, quarta-série, e, na capital paulista em época de ditadura militar incompetente, corrupta, violenta e senil, fui finalmente aportar, sem dinheiro no bolso, sem parentes importantes... exatamente como na balada do cantor Belchior... Longe de casa é um lugar que não há; não existimos, somos bichos estranhos no ninho da megalópolis, aliás, longe de Itararé somos um não-ser num não-lugar. Sem os bolinhos de chuva da mãe, sem a graciosidade das irmãs e irmãos, sem o acordeão vermelho do pai solando abismos de rosas, sem o chão, o luar, os bares e lares de uma Itararé que sempre amei tanto... O pai ligava chorando. Sabia que eu estava passando fome. Dizia que em casa eu teria meu cantinho, minha bóia (só Deus sabe o que um filho sente ausente de seu lar, de sua terra), mas eu, turrão, respondia: -Só volto formado ou morto. Mas era a angústia de ser um guri, bendito fruto, criado entre mulheres e longe de casa era estar literalmente no átomo sem cachorro... Um fanático por Itararé, lendo a Bíblia, lendo a história do pacifista indiano Mahatma Gandhi, alma rasgada, peito alquebrado, saudades de Itararé, da voz de clarineta da mãe, das ruas e quintais do guri ainda imberbe nos seus já sofridos 18 anos. Uma pensão na Rua Torres Tibagi, 55, Bom Retiro. A dona da pensão jogava fora as comidas de natal, as sobras das ceias, no lixo, achando que lá eu ia catar para não morrer de fome. Sempre fui de fibra, determinado, turrão; tinha vergonha na cara, não comi, três dias passando fome – e era Natal – mas eu esta lendo muito e ainda acreditava nos meus sonhos, ser um escritor, me formar, vencer na vida. Será o impossível? Só por Deus. Longe de Itararé somos andorinhas perdidas. Eu lia muito, escrevia muito. Fugia no letral. De afeto só as orações demoradas de minha mãe por mim, por meus sonhos, o guri espeloteado que estivera seis vezes para morrer, quando muito piá de tudo, e em Sampa era mais um na louca correria da lida. Até que arrumei um trampo. Encontrei-me com o Helio Porto e lá fui ser vendedor externo das lojas Ducal. O Helio me trazia, todo santo dia, uma marmita que a esposa dele me mandava. Jamais esquecerei esse dia. Jamais o esquecerei. Amigos para sempre. Depois da Ducal fui trabalhar na Drogasil, até que finalmente encontrei o Getulio Ferreira da Silva, que, no Rodoviário Itararé, do João Wiederin, Rua Rodolfo Miranda, Bom Retiro, foi um outro anjo que Deus colocou em minha vida. Voltei a estudar. Pensão da Dona Nena, Rua Prates. Sempre lendo e escrevendo muito. Liceu Coração de Jesus. A volta aos poucos pra casa, aos pedaços, começando uma trilha que iria longe. Eu estava no caminho certo. Ler uma fuga. Escrever uma alma respirando Itararé. Ninguém sabe o que passei. Um filho longe de Itararé é um ponto de interrogação na lágrima. Ah Itararé que eu adoro tanto. Depois fui trabalhar numa imobiliária, depois numa área contenciosa de uma empresa de cobranças, quando fui fazer direito e, malemal comecei, o pai faleceu, eu perdi o emprego por ter escrito artigo crítico num jornal universitário que atacava a ditadura mantida pela corrupção, depois perdi bolsa na faculdade. Tudo de novo. Tudo outra vez. E a mãe viúva para ajudar. Ninguém sabe o que é a dor de querer e não poder, mas tentar, manter as mãos limpas. Itararé é o mais perto do céu que eu posso chegar. A poesia é o mais perto do céu que eu posso chegar, Até que conheci a Musa-Vítima Rosangela que me deu uma familia musical. E Rosangela também é o mais perto do céu que eu posso chegar. Organizou minha rude vida, minha loucura, ajudou-me a participar de concursos, quando venci o primeiro, com um poema chamado Travessia de Elis (homenagem à Elis Regina.) Era um caminho, uma estrada. Eu falava de Itararé e ela ficava achando que talvez fosse só um sonho meu, uma espécie letral de Shangri-lá, Passárgada, Jerusalém. Falava do Mestre Jorge Chuéri, até que um dia ela veio conhecer Itararé e amou. “Em Itararé conheci o sentido exato do verbo existir, viver” disse a musa já cativada. Bebera a água da Barreira. Conheceu o Jorge Chuéri. Ficou fã como eu. Eu subi nos ombros de gigantes para enxergar melhores horizontes. Voltei aos poucos para a minha familia, para minha mãe, para Itararé. Minha vida teve rumo, um sentido. Mas nunca mais fui o mesmo. O guri de mim se perdeu. De lá para cá só vitórias. Há um Deus. Ah Itararé, ninguém sabe a dor que sente/Um filho ausente a chorar por ti... Cantei-te e canto em versos e prosas. Fiz o Hino ao Itarareense. Fui homenageado como um Leão do Centenário, nos cem anos de Itararé fiz minha exposição, o Palácio Vadico deu-me o título de Cidadão Itarareense, homenagearam meu pai Antenor Correa Leite com uma rua no Parque das Nações. Sou um vencedor. Ando pelas ruas de cacau quebrado de Itararé, de cabeça erguida. Comprei casa pra minha mãe em Itararé. Ganhei prêmios, fui entrevistado em jornais, rádios e canais de tevês, saí em jornais e outros veiculos de comunicação, estou em mais de 100 antologias, até no exterior, colaboro em quase 500 sites, sempre lendo, estudando, mas nunca rompi o cordão umbilical com Santa Itararé das Artes. Ah Itararé que eu adoro tanto. -Olhando para trás, sangue suor e lágrimas. Passei dos 50. O guri de 19 de agosto agora tem um cantinho pra chamar de seu. Quando eu era criança, pobre, comia terra. Pois trato bem Itararé, já que um dia, morrendo, certamente que serei sepultado no Cemitério Lágrimas do Céu de Itararé, então, naturalmente serei eu mesmo a própria Itararé, meu corpo será misturado com a terra-mãe. No futuro, no devir, quem sabe um dia, uma criança comendo terra comentará com a mãe que o torrão está com gosto de Poesia. Sou eu. Sou esse. Longe de Itararé fui bandeira de meu povo querido, embaixador, arauto, cantando minha aldeia-mãe, defendendo e promovendo a chamada Literatura Itarareense. Quando eu for saudade dirão: amou e cantou Itararé. Viveu para isso. Para isso serviu. E então lerão meu epitáfio: “Aqui Jazz Si...lás Três notas musicais exercitando o último solo. Amou, foi amado, fez todo mundo rir, tentou ser feliz. Nasceu analfabeto. Viveu estudando e escrevendo. Morreu aprendiz. The End -0- Silas Corrêa Leite São Paulo * Brasil



publicado por Do-verbo às 03:07
Quinta-feira, 11 de Março de 2010
Todos os dias
Eu olho para as minhas cicatrizes e penso
Sobrevivi
E fico feliz por estar aqui
Como poderia estar em qualquer lugar do mundo
E seria um vencedor

Molhei minhas estradas de lágrimas
O menino amadureceu a ferro e fogo
Mas eu olho as minhas cicatrizes como um mapa de vitórias
E agradeço a Deus por estar vivo
E porque Rosangela me ensinou a ser melhor quando testado
Pois a vida é um estoque de planos de resistências e nós permanecemos limpos
Na geografia da alma e da luz
Silas Correa Leite
Estado de São Paulo, Brasil


publicado por Do-verbo às 06:25
Segunda-feira, 30 de Novembro de 2009

OUTONAIS
(poemetos)

01)O feto, o que diria
Se pudesse falar?
(Prometo nunca mais Amar!)

02)As etiquetas
Denunciam
O defeito de fabricação
É de quem veste a roupa

03)Eu te escrevo, Vida
Como um louco escriba
Delata a própria sobrevivência
Em carne viva

04)Itararé não existe
É a mais pura ilusão
Palco iluminado alegre & triste
Na cor púrpura do meu coração

05)Era tão mal falada
Que só tinha uma saída
Ir morar lá na Índia
Para então ser sagrada

06)Rio-me de mim
Quando me vi, verme

07)As goteiras
São estrelas
Que, por sê-las
Esqueceram de usar rímel

08)No dia que vim-me embora
Meu pai não cabia em si
E minha mãe chorava, chorava e chorava
Enxugando as lágrimas numa avental sujo
De pimenta cumari


Silas Corrêa Leite
Estado de São Paulo, Brasil


Migrando para este novo espaço.


publicado por Do-verbo às 14:04

Quem é Silas Corrêa Leite?


Silas Corrêa Leite é autor de um vasto material ainda inédito, de romances a trabalhos sobre a Prática Educacional Vivenciada, poesia para jovens, coletânea de contos de realismo fantástico e outros. Ele conta, com a eloquência que lhe é peculiar, que pensa em traduzir seus trabalhos e tentar lançá-los no exterior, como fez com sucesso Ignácio de Loyola Brandão.Mas, sua versatilidade não pára por aí:
” Componho rocks, alas & blues, tenho pesquisas sobre Ética e Cidadania da Comunidade Carente e trabalhos para o público infanto-juvenil”.
Silas é membro da UBE-União Brasileira de Escritores.“Sou uma espécie de ” plantador de sonhos”, um “inventor do inexistente”, eterno aprendiz da alma humana, sonhando um neosocialismo de resultados.
” Escrevo para não ficar louco, ou melhor, para livrar-me do que crio, feito um “Sentidor”, para citar Clarice Lispector. A poesia que produzo é a oxigenação da minha alma”, ele diz. Ele se define como ” um Rimbaud pós-moderno (antena da época) que não acredita em sonho que não seja libertação, e registra para o futuro esses tempos tenebrosos de primatas globalizando a miséria absoluta e a violência sem fronteira, num país continental de muito ouro e pouco pão. Acredito, também, que só a mulher pode mudar o mundo. Como nem sempre elas captam funcionalmente isso, prefiro escrever meu despojo insano para dar meu testemunho nessa difícil lição da viagem de Existir”.
Silas colabora com diversos Suplementos Culturais, jornais, revistas e tablóides, com artigos, resenhas críticas, poemas, microcontos, trabalhos sobre “teens”, Educação, Política, Terceira Idade, Ética e outros temas.
Dentro do Mapa Cultural Paulista (Secretaria de Estado de Governo), foi escolhido por dois anos, representando Itararé, como um dos dez melhores contistas do Estado São Paulo.
Migrando para este novo espaço.


publicado por Do-verbo às 13:55
Registo de mim através de textos em verso e prosa.
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